sábado, 7 de junho de 2014

Por que devemos tomar antibióticos na hora certa e pelo tempo certo?




Você já deve ter ouvido de um médico que um antibiótico deve ser tomado, por exemplo, a cada 8 horas por 7 dias. Infelizmente, muitas pessoas acham que, quando já estão melhores, mesmo que ainda faltem alguns dias para o término do tratamento, podem parar de tomar o medicamento. Mas por que isso é errado?

O assunto é um pouco complexo, mas tentarei explicar de uma forma bem simplificada:

Uma infecção bacteriana acontece após entrarmos em contato com bactérias patogênicas (isto é, que podem causar doenças. A grande maioria das bactérias existentes é inofensiva). Como exemplo, podemos citar a ingestão de um alimento contaminado por "uma" bactéria. Na verdade, não é 1 bactéria, mas centenas de milhares a milhões delas. Após a ingestão, nosso organismo não consegue dar conta de eliminá-las, e elas vão se multiplicando até chegar a um número suficiente para provocar os sintomas da infecção.

Quando esses sintomas aparecem, o médico pode achar necessária a administração de um antibiótico. Dependendo do seu tipo de ação, um antibiótico pode ser bactericida (mata as bactérias) ou bacteriostático (impede seu crescimento e multiplicação).

Para exercer seu efeito de matar ou impedir o crescimento das bactérias, o antibiótico deve atingir e manter uma certa concentração no sangue por um período de tempo suficiente. Explico: após tomarmos um comprimido de antibiótico, este será absorvido através do intestino e cairá na corrente sanguínea, a partir de onde será distribuído pelo organismo. A dose deste antibiótico foi estudada para que ela atinja a concentração correta no sangue. Vamos tomar como exemplo um dos antibióticos mais usados, a Amoxicilina 500mg. Uma boa parte desses 500mg chegará ao sangue e atingirá a concentração ideal. Aos poucos, essa amoxicilina vai sendo eliminada pelo organismo, até baixar para uma concentração insuficiente para continuar matando as bactérias. Esse tempo é de aproximadamente 8 horas. Esse é o motivo pelo qual ela deve ser tomada de 8 em 8 horas.

Observe o seguinte gráfico:


























Nele, podemos observar a concentração de amoxicilina por tempo (linha vermelha) e a concentração mínima na qual ele é eficaz para matar as bactérias, chamada de Concentração Inibitória Mínima, ou C.I.M. (linha azul). Vemos que após a administração, a concentração sanguínea sobe rapidamente, e começa a cair, primeiro de maneira mais rápida, depois mais lenta. Depois de 8 horas, essa concentração passa a ficar abaixo da C.I.M., o que significa que a partir desse ponto o antibiótico deixa de ser eficaz, e as bactérias voltam a se multiplicar. Se for tomado com intervalo menor, haverá um excesso do medicamento no organismo, podendo levar ao aparecimento de efeitos tóxicos. Essa é a importância de se tomar os antibióticos no horário correto.

E por que devem ser tomados pelo número de dias correto?

Veja as seguintes figuras:



Podemos observar bactérias sensíveis (em azul), isto é, que morrem com o antibiótico, e bactérias resistentes (em vermelho), que não morrem com ele.

Na figura A, vemos uma infecção onde existem muito mais bactérias sensíveis do que resistentes. Tomando-se o antibiótico corretamente, restariam apenas umas poucas bactérias resistentes, as quais seriam facilmente eliminadas pelo próprio sistema imunológico do organismo.

Na figura B, podemos notar que, após o tratamento por um tempo mais curto do que o necessário, sobraram as bactérias resistentes e também algumas sensíveis. O problema é que essas bactérias resistentes conseguem transferir a parte do material genético que elas possuem e que confere resistência ao antibiótico para as bactérias sensíveis, que então tornam-se resistentes. Veja:





Na parte de cima da figura, à esquerda, vemos uma bactéria resistente, que possui um plasmídeo (anel duplo vermelho), que é o material genético que confere resistência ao antibiótico. À direita, uma bactéria sensível.

No meio, a bactéria resistente transfere uma cópia do seu plasmídeo à bactéria sensível, num processo chamado transferência de plasmídeo. Por fim, como mostra a parte de baixo da figura, estas duas bactérias estão resistentes ao antibiótico.

Agora, imagine isso em uma escala de centena de milhares a milhões de bactérias. Isso não afeta somente a quem tomou o antibiótico de maneira errada. Afeta também a todos os que forem infectados com as bactérias deste indivíduo, pois receberão bactérias resistentes, e o antibiótico não fará mais efeito.

E, infelizmente, isso já acontece. Muitos antibióticos estão deixando de fazer efeito graças ao uso inadequado. Daí o surgimento das chamadas superbactérias, que são resistentes a diversos antibióticos.

Então lembrem-se: sempre que tiverem que tomar antibióticos, respeitem os horários (mesmo que tenham que acordar de madrugada) e tempo de tratamento, pois isso poderá ser a diferença entre acabar com uma doença ou criar uma superbactéria!

Espero ter ajudado! Porém, como eu já disse, trata-se de um assunto complexo e muito técnico, e é muito difícil resumi-lo numa linguagem mais simples. Caso tenham dúvidas, por favor, perguntem nos comentários, que tentarei respondê-las assim que possível!

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Por quê o Soro Fisiológico tem este nome?

Se você nunca usou soro fisiológico (ou solução fisiológica) na sua vida, muito provavelmente já ouviu falar nele. De utilização extremamente comum, pode ser usado para limpeza de feridas, curativos, lentes de contato, dentre outros usos.




Mas por quê ele recebe este nome?

De acordo com a definição da Wikipédia, a palavra Fisiologia "(do grego physis = natureza, função ou funcionamento; e logos = palavra ou estudo) é o ramo da biologia que estuda as múltiplas funções mecânicasfísicas e bioquímicas nos seres vivos. De uma forma mais sintética, a fisiologia estuda o funcionamento do organismo."

Fisiológico, então, é o que refere-se à fisiologia. Então o que aquele famoso soro tem a ver com a fisiologia?

Nosso corpo é formado por aproximadamente 65-75% de água. Esta água está distribuída por todo o organismo, fazendo parte do líquido presente dentro e fora das células, do sangue, da saliva, da lágrima, entre outros. Ela não é pura: existem muitas substâncias dissolvidas nela. Uma delas, das mais importantes, é o cloreto de sódio.

Sim, o cloreto de sódio é exatamente aquele "pozinho" branco que geralmente encontramos num frasco sobre quase todas as mesas de restaurantes e lanchonetes: o sal.

Nos líquidos de nosso organismo, na maioria dos tecidos, a concentração de cloreto de sódio é de 0,9%, ou seja, 0,9g a cada 100mL Portanto, essa é a concentração para o funcionamento do corpo, portanto é a concentração fisiológica.

A composição do soro fisiológico é apenas cloreto de sódio em água, em concentração de 0,9%. Ou seja, uma concentração fisiológica. Daí o nome Soro Fisiológico!

Por esse motivo o soro tem o "sabor" parecido com o da lágrima, já que ambos têm a mesma concentração de sal. E é também por isso que ele pode ser utilizado no olho, em lentes de contato, feridas, medicamentos injetáveis...

Mas fiquem tranquilos: apesar de o cloreto de sódio ser o mesmo do sal de cozinha, o que é utilizado no soro fisiológico é de pureza de grau farmacêutico. Isto significa que é muito mais puro do que o sal comum.

E por que não usamos simplesmente água pura (destilada ou deionizada) no lugar do soro?

Porque essa água tenderia a entrar nos tecidos corporais, para diluir a concentração de sal nesses locais, processo conhecido como osmose. Isso provocaria um edema (inchaço) nesses tecidos, além de outros problemas potencialmente mais graves.




sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Diclofenaco sódico deve ser evitado por hipertensos? E o potássico?

No meu post sobre as diferenças entre os tipos de diclofenaco, pude notar, nos comentários, que existe mais um mito a respeito deste medicamento: de que o diclofenaco sódico não deve ser usado por hipertensos, devendo ser utilizado o diclofenaco potássico nestes casos.

Peço desculpas aos leigos, mas para chegar à minha conclusão, preciso apresentar alguns argumentos técnicos. Porém, farei o máximo para simplificá-los.

A massa molecular do diclofenaco sódico é aproximadamente 318. A massa atômica do sódio é 23. Então, a massa somente do sódio equivale a 7,23% da massa do diclofenaco sódico.

Um comprimido de diclofenaco sódico comum contém 50 mg desta substância. 7,23% destes 50 mg são 3,6 mg. Podemos concluir que a quantidade de sódio proveniente do diclofenaco, por comprimido, é de 3,6 mg.

A posologia usual é de 1 comprimido a cada 8 horas, o que dá 3 comprimidos por dia. Temos então 10,8 mg de sódio diários provenientes do diclofenaco dos 3 comprimidos.

A quantidade de sódio recomendada por dia deve ser de no máximo 2.300 mg, de preferência ficando abaixo de 2.000 mg. Para portadores de hipertensão (pressão alta), essa quantidade deve baixar para no máximo 1.500 mg por dia. Isso nos mostra que os 10,8 mg provenientes do diclofenaco são praticamente irrelevantes com relação ao total diário.

Então um paciente hipertenso pode tomar tranquilamente o diclofenaco sódico??? NÃO!!!

E por que não?

Porque a maioria dos anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs), incluídos aí os diclofenacos sódico e potássico, podem elevar a pressão arterial. Esta elevação pode ser ainda maior em pacientes hipertensos.

Conclusão: pacientes hipertensos não devem usar diclofenaco sódico nem potássico sem orientação médica, pois ambos podem provocar um aumento da pressão arterial, não pelo conteúdo de sódio, mas pela própria ação (farmacodinâmica) do diclofenaco.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Qual a diferença entre Diarreia e Disenteria (ou seria Desinteria)?

Essa é uma dúvida bastante frequente, mas não tão difícil de ser respondida.

A Diarreia é o aumento do número de evacuações, normalmente (mas não sempre) acompanhadas por fezes amolecidas (pastosas ou líquidas).

Pode ser causada por diversos fatores, como infecções por vírus, bactérias ou parasitas; medicamentos, alergias, ou ainda doenças inflamatórias intestinais.

O principal problema causado pela diarreia é a desidratação, que pode levar à morte principalmente crianças e idosos.

Já a Disenteria é uma doença inflamatória intestinal que provoca diarreia, mas sempre acompanhada por muco e sangue.

É também causada por infecções virais, bacterianas, protozoárias ou parasíticas.

Pessoas com disenteria em geral apresentam febre, tosse, cólicas intestinais e diminuição do apetite, podendo levar rapidamente à perda de peso e até à desnutrição.

E qual o correto? Disenteria ou Desinteria?

Por se tratar de uma doença (disfunção) do intestino (entérica), ou seja, disfunção entérica, o correto é Disenteria.

Então, resumindo:

Se você tiver uma diarreia, mas estiver saindo sangue e muco, é na verdade uma disenteria.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Por que os médicos sempre dizem que é uma Virose?

É muito comum a reclamação, por parte dos pacientes, quando estes procuram o médico e recebem como diagnóstico: "Isto é uma virose!". Por que os médicos sempre respondem isto?

Tecnicamente falando, virose é qualquer doença causada por vírus. Podemos então dizer que gripe, resfriado e até mesmo a AIDS são viroses.

Mas as reclamações surgem quando o diagnóstico é recebido diante de um quadro que apresenta, geralmente: diarreia, vômitos, indisposição, dores no corpo, e até mesmo febre. O médico diz que é preciso ingerir bastante líquidos, e prescreve um simples analgésico para as dores e a febre. "Ele disse que eu tenho uma virose, só passou um remedinho pra dor e mandou eu tomar bastante líquido! Nem me olhou direito! Por que não me passou um remédio mais forte? Acho que ele nem sabe o que eu tenho, então diz que é virose!". Essa é uma queixa bastante comum!

Vamos entender uma coisa: as doenças causadas por vírus são extremamente difíceis de serem tratadas com medicamentos. Como exemplo, o vírus da AIDS só consegue ser controlado através de uma combinação de diversos medicamentos, que mesmo assim não acabam com ele. O vírus da gripe também pode ser tratado com um medicamento específico para ele (Tamiflu - oseltamivir). Já os vírus que causam resfriados não têm tratamento específico, e por isso controlam-se apenas os sintomas, como febre e dores de cabeça e corpo.

É esse o caso das viroses gastrointestinais, muito comuns no verão. Também são causadas por diversos tipos de vírus, e não há tratamento específico. Por este motivo, devemos apenas controlar os sintomas (febre e dores), e o mais importante: manter a hidratação, pois perde-se muita água e sais minerais por causa da diarreia. Geralmente, a doença dura poucos dias, e não há medicamento que acelere a cura.

Da próxima vez que receber um diagnóstico de virose, não revolte-se com seu médico! Ele apenas está fazendo o que deve ser feito!

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